
Para que possamos falar do Ultra-Romantismo, precisamos
primeiro entender seu estilo maior, o Romantismo. A principal
característica do Romantismo em seus três períodos
é o sentimentalismo; a supervalorização das
emoções pessoais: nesse estilo é o interior
humano que conta, o subjetivismo. À medida que a busca
dos valores pessoais se intensifica (como o culto do individualismo),
perde-se a consciência do coletivo social. A excessiva valorização
do "eu" gera o egocentrismo: o ego como centro do universo.
Evidentemente, surge aí um choque entre a realidade objetiva
e o mundo interior do poeta. A derrota inevitável do ego
produz um estado de frustração e tédio, que
conduz à evasão romântica. Seguem-se constantes
e múltiplas fugas da realidade: o álcool, o ópio,
os prostíbulos, a saudade da infância, as constantes
idealizações da sociedade, do amor, da mulher. O
romântico foge no tempo e no espaço. No entanto,
essas fugas têm ida e volta, exceção feita
à maior de todas as fugas românticas: a morte.
Houve uma sensível mudança no comportamento
dos autores românticos: há algumas semelhanças
entre os autores de um mesmo período, mas a comparação
entre os primeiros e os últimos representantes, revela
profundas diferenças. No Brasil, por exemplo, há
uma distância considerável entre a poesia de Gonçalves
Dias (primeira geração - Indianista ou Nacionalista),
de Álvares
de Azevedo (segunda geração - Ultra-Romantismo)
e de Castro Alves (terceira geração - Condoreira).
Por isso há a necessidade de se dividir o Romantismo em
gerações.
A Segunda
Geração da Poesia Romântica
"No Brasil, ultra-românticos foram
os poetas-estudantes, quase todos falecidos na segunda adolescência,
membros de rodas boêmias, dilacerados entre um erotismo
lânguido e o sarcasmo obsceno. Os que dobraram a casa dos
vinte e cinco acumularam os fracassos profissionais e os rasgos
de instabilidade, confirmando a índole desajustada desses
'poetas da dúvida', a que faltam por completo a afirmatividade
dos românticos indianistas e a combatividade dos condoreiros."
(José
Guilherme Merquior)
Esta segunda geração da poesia romântica
brasileira é marcada pela falência dos ideais nacionalistas
utópicos dos nossos primeiros românticos. A oclusão
do sujeito em si próprio é detectável por
um fenômeno bem conhecido: o devaneio, o erotismo difuso
e obsessivo, a melancolia, o tédio, o namoro com a imagem
da morte na figura feminina, a depressão, a auto-ironia
masoquista: desfigurações de um desejo de viver
que não almejou sair do labirinto onde se aliena o jovem
crescido e em fase de estagnação.
Enquanto o homem busca um espaço social,
muitas vezes iludido quanto às possibilidades concretas
de atingi-lo, o ultra-romântico afasta-se; opta pela fantasia
ao invés da realidade, entrega-se aos seus próprios
fantasmas, oculta-se do mundo passando a ser ele mesmo o seu mundo.
Assim o poeta sente-se liberto dos condicionamentos e feridas
ao tentar adaptar-se. Entretanto, esta atitude o escraviza quando
levado ao extremo: negar a vida conduz ao delírio da morte,
ao excessivo egocentrismo, à nostalgia de um passado medieval,
desta vez idealizado, mais nobre, menos embrutecedor. Segue-se
as ilusões deste passado, o seu culto, do qual resultam
mais demônios do que anjos. O poeta consumido por suas próprias
idéias, torna-se "fantasma" ao invés de
"eleito", transforma-se em "suicida vitimado"
pela necessidade de uma vida melhor, uma vida maior, que, no entanto,
não consegue conquistar.
O chamado "mal-do-século" foi
difundido no Ultra-Romantismo. Cultivado na Universidade do Largo
São Francisco, retrata reuniões regadas a vinho
e éter geralmente em repúblicas e cemitérios.
Influenciado pelas obras de Lord
Byron, Álvares de Azevedo foi o maior representante
da Segunda Geração Romântica. Sua prosa apresenta
o noturno, o aventuresco, o macabro, o satânico, o incestuoso,
os elementos do romantismo maldito. Abrangem o amor e a morte
sob uma perspectiva exacerbadamente egocêntrica.
Ao lado de Álvares de Azevedo, três
outros autores destacam-se na segunda geração da
poesia romântica brasileira: Casimiro
de Abreu, Fagundes
Varela e Junqueira
Freire. As obras literárias de cada poeta e de seus
períodos respectivos, apresentam entre si uma característica
comum: o medo de amar. Esse temor é, em essência,
o medo de macular a virgem, de entregar-se ao prazer carnal e,
assim, destruir o próprio amor que, na visão deles,
passa a ser sinônimo de impureza e pecado.
Características
gerais do Ultra-Romantismo